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Só nosso

por Marina Ricardo, em 13.05.13

Nunca aqui falei de religião – e não, não é por ter credo, ou ser púdica quanto ao tema. Tenho a primeira, nunca toquei a segunda.

No entanto, este blog é uma parte te mim, e tal como eu, vai crescendo, sendo que, só agora se tornou maduro o suficiente para refletir sobre o assunto. Melhor, estamos os dois, ele e eu, crescidos o suficiente para isso.

O texto é longo, a opinião também.

 

De algum tempo para cá, tenho uma relação algo estranha com a religião. Ou, talvez sempre tenha tido. Nunca lidei bem com coisas que não pudemos questionar ou aceitar cegamente. Faço demasiadas perguntas para isso, sou demasiado teimosa e complexa para tal.
Por isso, não espantei ninguém quando, depois do crisma, me afastei de tudo o que era religioso. Desisti. Ponto. Não podia divulgar uma coisa que não compreendia completamente, que não concordo totalmente.
E, tempos mais tarde, cortei relações com o meu lado mais místico – zanguei-me de tal forma com os deuses que não sabia como reagir perante nada que fosse religioso.
Aqui está – zanguei-me com Deus, com o criador ou quem quer que Ele seja. Zanguei-me porque não queria acreditar que certo tipo de coisas pudessem acontecer – porque raio as coisas más só aconteciam às pessoas boas? Porque temos de ver – impotentemente, os outros a sofrer? Zanguei-me por não ter respostas, por não ter saídas.
Em pequena era grande, melhor GRANDE (em maiúsculas!) fã de Anjo Selvagem, e a Mariana (personagem que a Paula Neves interpretava) era e tal forma ligada a Deus que o tratava por “amiguinho”. Nessa altura aquilo pareceu-me ideia: era aquela relação pacífica e calma que eu queria ter com o meu lado místico.
A coisa até resultou – assim para o muito mais ou menos (ela era BEM mais empenhada do que eu), passei a tentar rezar (mais quando precisava do que espontaneamente), conversava mentalmente com um tal de Ele, e depois dizia umas orações que me tinham ensinado.
Porém, as coisas foram perdendo sentido à medida que a minha revolta acendia. E, então deixei de querer relacionar-me com forças sobrenaturais que em vez do bem, praticavam o mal.
Não posso dizer, que quando estava mais no fundo do poço, não soltasse um “Valha-me Deus”, ou um “Deus me ajude”, ou não dissesse uns pais nossos para o exame me correr melhor – até o posso ter feito, mas estava demasiado zangada. Demasiado cansada.
Mas, mesmo no meio desta revolta religiosa, houve sempre algo que se manteve intacto:
Desde que me lembro que a minha avó vai (ou ia) a pé a Fátima (sei que cumpria -e ainda cumpre, uma promessa) e desde sempre estabeleci, com aquele lugar, uma relação afetiva que vai muito para além do religioso.
Naquela semana que a minha avó estava fora, eu ficava em casa dela, com o meu avô. Era quase como se fosse uma festa do pijama permanente. Uma semana de coisas boas. Só coisas boas – coisas que hoje são das melhores memórias que alguém pode colher desta vida.
Depois, sempre a dia 12 ou 13 de Maio, bem cedinho, íamos ter com minha avó – uma família, horas, dentro de um carro pequenino.
Comprávamos velas a assistíamos às celebrações. Por vezes, durante o “adeus à virgem” via gente a chorar e não compreendia (agora eu chora, e não me compreendo). Não percebia o porquê de ver tanta gente de pés descalços, de bengalas, de t-shirts iguais com a palavra “peregrino” ao peito. Não compreendia as diferentes línguas que se ouviam em meu redor, mas, era fácil dizer que todos trocavam palavras gentis e rezavam – isso sim, era fácil de perceber.
Não percebia muito, mas gostava. Havia uma paz no ar, e sempre uma pomba branca no céu.
Hoje, percebo. Ou pelo menos, percebo melhor. Percebo porque percebo as pessoas, e percebo que é a fé das pessoas que muda o mundo. E, todos temos fé, todos temos crenças – num Deus, na música, nos livros, nas letras, nas pessoas, no amor. E, eu acho que sou uma catalisadora de fés - minhas e dos outros.
Agora, vi-me obrigada a repensar a minha posição face ao “além” – temos de o fazer quando amamos tanto os que nos rodeiam e temos medo que os nosso braços não os possam agarrar sempre, para sempre. Ou, então quando os que amamos não estão aqui, em corpo, e precisamos de acreditar que algures, estão bem, bem melhor.
Se há um Deus como pinta a bíblia não sei. Pintei o meu Deus com a fé dos homens, aquela que a minha avó me ensinou, com o amor de festa permanente com que o meu avô me brindava quando tínhamos uma semana só nossa, quando o mundo era nosso. Só nosso.

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