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Conheci a A. num Setembro há já quase uma mão cheia de anos. Mudou-se para o quarto ao lado e eu, no primeiro dia, nem gostei assim muito dela. Aos poucos a A. foi-se entranhando. Em mim. Em todos. Em tudo.
Vivi com a A. 24 sobre 24 horas, durante três anos. Mais de mil dias. Número incontável de memórias. Com a A. fiz das coisas mais malucas da minha vida. Das melhores e das piores. Somos dois polos positivos. Juntas somos sempre mais e mais. Com ela sou sempre melhor, capaz de mais e melhor. Juntas ninguém nos para e somos capazes de tudo.
Nunca pensei que a A. saísse da minha vida. Nunca tal me passou pela cabeça. Até ao dia que a perdi. Fui perdendo a A. de dia para dia - o que ainda me doía mais. Ficamos mais de que metade desde ano sem trocarmos uma palavra. E todos os dias a tentava enterrar. Todos os dias dizia a mim própria que nem me importava. Sempre fui boa a mentir a mim mesma.
Na quarta-feira passada a A. mandou-me um email. Primeiro fiquei paralisada, depois tive um ataque de choro. Mandei-a logo vir até cá. Abrir um dos cortes mais profundos que tinha parecia a melhor maneira do o curar.
Ela veio. E com ela trouxe aquela presença de que eu sentia tanta falta. Veio e trouxe um convite de casamento no bolso.
Resolvida a distância, levou-me com ela para ultimarmos os preparativos para a cerimónia.
A A. casou no sábado. Uma das minhas pessoas favoritas de sempre casou. E eu recuperei-a. Voltamos às aventuras (fazer brindes de casamento e levanta vestidos em lojas de noivas serão sempre aventuras) - e, agora não te volto a perder, miúda!
O perdão apanha-nos sempre nas vielas mais estreitas e feias da vida. O perdão atira-nos ao chão, empurrando-nos pelas costas. O perdão nunca tem tempo e vem quase sempre atrasado. Arrebata-nos e faz-nos sentir pequenos. Curar feridas antigas doí. Perdoar doí muito. Doí tudo. Mas, depois, tudo acaba e somos leves outra vez. A vida nunca me para de surpreender. Nunca. E, esta será sempre a melhor parte de estar vivo.
Preencho os meus silêsncios com palavras que calo. Calada. Ando calada das palavras que tenho a dizer.
A falta de tempo é quase sempre apontada como justificação para quase tudo. Não fomos aqui. Não vimos aquele filme. Não telefonamos aquele amigo. Não, não, não.
Uso a mesma desculpa sem ponta de remorso. Mas, no fundo, no fundo, sei que não é bem verdade. Tive tempo, mas, ocupei esse tempo com outras coisas.
Não escrevi porque estive a ver televisão. Não li porque ando a adiar as lágrimas que leitura me vai trazer. Não fui porque me esqueci, ou talvez tenho feito de propósito para me esquecer.
Adio muitas coisas. Digo que não tenho tempo para outras coisas. Mas, no fundo, no fundo, até tenho tempo. Tenho, mas ocupo-o com outras coisas, mais ou menos necessárias.
Tento guardar sempre tempo para as coisas importantes. Manter-me perto do que e dos que são importantes. Tento sempre ter tempo para eles. Ou então, criar tempo. Inventar tempo.
O meu dia tem sempre 24 horas, mas, ás vezes arranjo mais 10 minutos para ter tempo. Tempo extra. Porque quero. Porque sim, sim esim.
Ou, então fingo que tenho só 22 horas no meu dia e não tenho tempo. Porque não quero. Não. não e não.
O medo, louco, bate-me nas paredes das entranhas do corpo.
Sento-me e respiro fundo. Enterro-o. Enterra-lo torna-o mais meu, mas também o mantem camuflado.
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