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Hoje estávamos a almoçar, com a televisão como barulho de fundo, quando soltei a frase “o jornalismo deprime-me”.
A minha mãe, sentada a meu lado, sabendo bem a filha que fez nascer, arregalou-me os olhos. Ela sabe que tenho sempre opinião sobre tudo, mas, igualmente sabe o amor que eu tenho pela área que estudei.
Porém, eu não estava a mentir: o jornalismo atual deprime-me.
Tenho uma paixão pelo jornalismo. Coisa antiga que nem sei bem como nasceu. Se calhar nem nasceu, nasci eu e a coisa deu-se.
Já amava, sem saber, as letras, quando, um dia, percebi que era a rádio que me fazia suspirar. Quis tanto ser boa em rádio, que na primeira vez que experimentei, senti tantas borboletas no estômago que pensei que não era capaz. Mas, fui. E era boa no que fazia.
Amei cada segundo em que, noite adentro, estive na rádio – aquele espaço maravilho e quentinho que tantas coisas me ensinou. Da mesma forma que hoje guardo com saudade todas as noites que passei em claro a escrever noticias, a editar peças, a magicar guiões de programas, a pesquisar informações para entrevistas. Ao fim de algum tempo, as coisas saiam de mim de forma natural e eu sabia que era amor.
Esta narração pseudo-romântica é bonita, mas, já não me aquece os dias – aquece-me a memória e nada mais.
Na universidade estudei muito o passado do jornalismo, como nasceu, como cresceu, de que forma deu os primeiros passos. Lembro-me também, de nos ensinarem que o jornalismo assume a função de quarto poder. Na altura, não dei grande valor a nenhuma destas matérias. Estudei-as, debitei-as, nada mais. Não me apercebi que, de facto, o jornalismo tem poder. Real.
Assusta-me olhar para a televisão e ver noticia completamente destruturadas, coisas sem pés nem cabeça, casos sérios, tratados da forma mais irresponsável e leviana possível. Escava-se a carne de quem sangra – em direto, na tv. Nos jornais fazem-se capas de bradar aos céus, quais revistas cor-de-rosa (nem vamos enveredar por esse caminho…).
E, depois não se estuda como se deve, não se faz o trabalho de casa. Dá-se opinião. Ou, então censura-se. Usurpa-se informação e apimenta-se a coisa. Vende mais. Rende mais.
E, depois é difícil lá entrar quando o nosso pai é Sr. e não Dr., e quando somos pobres e regime de voluntariado não enche barriga (procura-se jornalista em regime de voluntariado para estágio não remunera de, no mínimo seis meses. OK.).
Sinto o cheiro a dinheiro alheio, a luta por audiências, a manipulação sempre que olho para a televisão. No carro, a caminho do trabalho, desligo o rádio, e ligo o telemóvel em alta voz, naquela música reconfortante, ao som da qual chorei no outro dia – mais vale; pelo tempo da viagem só ouvia publicidade.
O jornalismo, os donos do jornalismo, estão a matar o sonho que sonhei. O sonho que outros antes de mim, sonharam. O jornalismo deprime-me. O coitado não tem culpa – tem maus pais e ninguém pode escolher a família onde nasce.
(aquele tempo em que eramos jornalista felizes)
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