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Tenho fugido muito do que sinto.
Sigo em frente, trabalho muito, e arumo tudo em caixinhas que adio abrir ou gerir.
Não tenho escrito. Porque não quero remexer no cenário arrumadinho que tenho criado.
Faço anos domingo. Mudo de local de trabalho segunda-feira.
Passei a manhã a despedir-me da minha equipa de trabalho, e enquanto tento faze-los parar de chorar, faço das tripas coração.
Faço anos domingo.
Mudo de local de trabalho segunda-feira.
Ano novo, vida nova.
Trabalhei com uma folga semanal durante um mês.
Perdi a conta as horas de trabalho diárias porque na verdade deixei de contar. Assim como já não conto as desinfeções e as lavagens das mãos.
Já não reparo do desconforto da máscara ou da viseira, nem tão pouco me incomodam os óculos de vidros embaciados.
Sinto-me muito cansada. E ligeiramente descrente por não ver a contenção e confinamento que me vende a televisão.
Todos os dias lido com caos, confusão, exagero, falta de cuidado (outras tantas faltas de respeito).
Estive esta semana em casa. A gozar folgas em atraso. E, continuo muito cansada. E, sinto que este cansaço não me vai sair do corpo durante muito tempo.
Entro no carro. Ponho a chave na ignição. Um pedal, uma mudança. Respiro longamente. Uns dias mais fundo do que outros.
Ligo o rádio. Aumento o volume, até não haver mais volume para aumentar.
Abro o vidro do carro, enquanto faço inversão de marcha.
Certifico-me que o volume do rádio está no máximo. Está sempre.
Não importa a música. Vou sempre cantar demasiado alto. Até me doer a cabeça e a garganta.
Até os outros condutores me olharem de lado.
Sigo para casa.
E, durante aqueles pouco mais de três minutos finjo que está tudo bem. Que este não é só mais um dia riscado do calendário.
E, de súbito, dia depois de dia,
estes tornaram-se os únicos três minutos diários de normalidade que tenho.
No dia em que estiver em casa e não me ligarem do trabalho, até vai parecer que estou de folga......
Trabalho num local onde, subitamente, ter opinião e personalidade se confundiu com mau feitio.
Como se verbalizar o que se pensa, trabalhar no que se acredita, ter empatia com a equipa e ser educado e compreensivo fosse ofensivo. Fraco. Mau.
É cada vez mais difícil. Para mim. Não para eles.
Tive aumento de salário.
Tive uma reunião para me comunicarem que tinha sido aumentada.
Sou mediana. Sou má chefe. E tive uma avaliação má – avaliação essa que não tive acesso, avaliação essa que foi feita por a minha anterior avaliação (em meados de Janeiro, de Muito Bom) ser inválida (ninguém me explica o grau de invalidez da mesma).
Comunicaram-me que tinha aumento, da mesma forma que me comunicariam que tenho uma doença qualquer. Insatisfeitos, contrariados. Como se devesse ter vergonha por isso.
E, eu, exausta disto tudo, ri-me. Porque sou péssima. E porque trabalho mais de sessenta horas semanais. E porque me ligam no mínimo oito vezes depois de sair da loja, e nas folgas. Por ser culpada de tudo. Por estar sempre em stress, por estar sempre a discutir. Por estar sempre a ser descredibilizada.
Rio-me de frustração, gozo e cansaço. Rio-me de mim. Por não saber desistir.
Tive um aumento de três dígitos. E, pelos vistos tenho que me sentir envergonhada por isso. Porque sou péssima.
Não sei se fico mais chocada com o facto de um padre ter sido pai, ou com o facto do mesmo se chamar "Giselo".
Estive uma semana de férias e já tive as duas folgas semanais.
Amanhã regresso ao trabalho.
Volto a vestir a faceta forte e a cara cansada. Volto a só falar de trabalho, a sonhar só com o trabalho.
Voltam também as discussões barulhentas e sem sentido. Os problemas estúpidos. Voltam os telefonemas de trabalho a todas as horas do dia. Volta o MRP, as rupturas, as alocações, os clientes, o absentismos, os inventários...
Amanhão volto para o trabalho que me consome.
Acaba hoje a minha paz.
Termino hoje as férias. Regresso quarta-feira ao trabalho (amanhã estoude folga...).
Sinto-me tão eu como há muito não me sentia. Acordada. Focada. Feliz. Genuinamente feliz.
Sem estar exausta, ou a morrer de sono.
Sei que quando chegar à loja vou ter um choque qualquer de realidade e vou voltar a vestir a pele de guerreira que tenho enverado há meses. Porque sei que vou precisar dela. Porque a Marina leve que hoje vos escreve não é dura o suficiente.
Sei que esta aura de paz que criei é ténue como um nevoeiro e que pode desaparecer em breve. Mas, valeu a pena mergulhar e mergulhar dela 10 doces dias.
Pedi o medo de ler. Tenho tentado escrever. Tenho feito flores de papel. Enviado postais.
Voltei a lugares onde sou sempre feliz, voltei ao exercício. Equilibrei-me.
Tenho sido a Marina que sou, em vez da Marina que criei.
Foram umas valentes férias de mim, com regresso a mim mesma. É uma pena terem que acabar…
Queria mentir. Dizer que não sou uma daquelas pessoas que ainda a contar os dias para ficar de férias.
Mas, cá estou eu a contar os dias.
Minto, hoje, desde as 5:30 que, para além dos dias, também contei as horas….
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